Em João Pes­soa, onde esta­va, em mea­d­os de dezem­bro de 1981, Cel­so Fur­ta­do (em Diários Inter­mi­tentes, livro orga­ni­za­do por Rosa Freire d’Aguiar, para a Cia das Letras, em 2019), nos­so maior pen­sador econômi­co (não digo econ­o­mista, pois seria pouco para diz­er o modo como ele con­stru­iu seu pen­sa­men­to críti­co e seus impor­tantes pro­je­tos) com acuidade car­ac­ter­i­zou a difer­ença entre o “isso” e o “isso aí”, ao obser­var a difi­cul­dade brasileira em conec­tar os even­tos da vida políti­ca a uma reflexão políti­ca: “os jor­nais pub­licaram uma fotografia de uma esco­la, que a polí­cia destruíra a pedi­do de um lat­i­fundiário, para con­fir­mar que a ter­ra lhe per­tence e não a uma comu­nidade cam­pone­sa que dela tem a posse. Isso está entre os faits divers, não tem reper­cussão políti­ca. Todo mun­do está descon­tente e gostaria que ‘isso’ mudasse, mas não rela­ciona os priv­ilé­gios de que des­fru­ta com ‘isso aí’.”
Cel­so Fur­ta­do pas­sou sua vida inteira dizen­do que o mun­do podia ser mel­hor, como admi­tiu, sem­pre salien­tan­do “que há algo a faz­er em cada momen­to”.
Hoje, dia em que com­ple­taria cem anos, é impre­scindív­el lem­brar e recu­per­ar esse exem­p­lo e esse pen­sa­men­to, se dese­jamos, de fato, con­tin­uar o difí­cil cam­in­ho de con­strução de um País mel­hor para todos, em que o desen­volvi­men­to ultra­passe as lin­has da mera econo­mia instru­men­tal e toque a esfera da cul­tura, envol­ven­do a sociedade, con­sciente de que os fatos do mun­do estão lig­a­dos por lin­ha tênue, que somente pen­sadores desse porte con­seguem ver e ensi­nar a acom­pan­har.
Acom­pan­hemos o mel­hor.