Em arti­go pub­li­ca­do orig­i­nal­mente no jor­nal O Esta­do de São Paulo, o Advo­ga­do Antônio Cláu­dio Mariz de Oliveira, Acadêmi­co Tit­u­lar da Acad­e­mia Paulista de Dire­ito, fala de seu enga­ja­men­to na con­strução human­ista e democráti­ca da Ordem dos Advo­ga­dos do Brasil, des­de 1974, e, relem­bran­do os val­ores que devem pau­tar a atu­ação de advo­ga­dos e advo­gadas, na gestão da enti­dade, acen­tuan­do o serviço que devem prestar a esse “tem­p­lo ded­i­ca­do ao cul­to da liber­dade e do human­is­mo.

Leia, a seguir, o tex­to com­ple­to.

A advocacia vai às urnas novamente

Antônio Cláu­dio Mariz de Oliveira

A advo­ca­cia paulista vai às urnas nova­mente. Exer­cí­cio democráti­co que se repete des­de o nasci­men­to da Ordem dos Advo­ga­dos do Brasil, Sec­cional São Paulo (OAB-SP), em 1932. A mes­ma práti­ca fora ini­ci­a­da pela enti­dade mãe da OAB, o Insti­tuo dos Advo­ga­dos Brasileiros, em 1843, quan­do de sua fun­dação. Assim, a enti­dade rep­re­sen­ta­ti­va dos advo­ga­dos brasileiros sem­pre prati­cou a democ­ra­cia por meio do voto, uma das suas mais expres­si­vas man­i­fes­tações.

Não se pense, no entan­to, que a rep­re­sen­tação da classe é retrata­da de for­ma fiel e autên­ti­ca. Não, não con­seguimos, ain­da, implan­tar as eleições dire­tas para que prevaleça o quer­er da maio­r­ia dos advo­ga­dos quan­to a quem dev­erá falar em seu nome como pres­i­dente da nos­sa enti­dade: a Ordem dos Advo­ga­dos do Brasil. Esse, até hoje, é eleito por escrutínio indi­re­to, regi­do por um sis­tema eleitoral her­méti­co, pouco viáv­el para que um grupo oposi­cionista pos­sa obter êxi­to eleitoral. Por­tan­to, um sis­tema que reflete uma democ­ra­cia mit­i­ga­da, capen­ga.

O afas­ta­men­to da classe na eleição pres­i­den­cial da ordem rep­re­sen­ta uma incon­gruên­cia de difí­cil ou inex­is­tente expli­cação: os advo­ga­dos foram os van­guardeiros da luta pela implan­tação do pleito dire­to para a escol­ha do pres­i­dente da Repúbli­ca na déca­da de 1980. No entan­to, jamais elegeram o seu pres­i­dente de for­ma dire­ta.

Con­seguiram, graças a um extra­ordinário empen­ho, jun­to com out­ras insti­tu­ições, que o povo elegesse o seu man­datário. No entan­to, na sua insti­tu­ição, a par­tic­i­pação para a escol­ha do diri­gente máx­i­mo é lim­i­ta­da. Hoje há uma forte tendên­cia na advo­ca­cia para a adoção das eleições dire­tas. É pos­sív­el que em breve sejamos os respon­sáveis pela escol­ha de quem quis­er­mos que nos diri­ja. No entan­to, hoje a for­ma de eleição mac­u­la e com­pro­m­ete a legit­im­i­dade do próprio manda­to pres­i­den­cial.

A grandeza da advocacia não permite que a nossa entidade seja considerada um clube recreativo, uma ação entre amigos ou um espaço para realizações pessoais

Essa peque­na digressão-desabafo não me reti­ra o entu­si­as­mo por mais uma eleição na ordem, sec­cional de São Paulo. Eu con­fes­so com cer­to orgul­ho que as acom­pan­ho des­de 1974, por­tan­to, há 50 anos. E mais, a par­tir daque­las ocor­ri­das em 1978, eu par­ticipei enga­ja­do em quase todas as can­di­dat­uras das eleições até os nos­sos dias. Fui eleito para pre­sidir a sec­cional por dois biênios, de 1987 até 1990.

Deve ser esclare­ci­do que nas eleições para os Con­sel­hos Sec­cionais as cha­pas desta­cam quem será o pres­i­dente caso ela seja elei­ta. Assim, ao votar no grupo, vota-se no futuro pres­i­dente. É uma for­ma de eleição dire­ta.

Essa min­ha tra­jetória parece autor­izar-me a faz­er um aler­ta, ao lado do já expos­to incon­formis­mo com as eleições indi­re­tas.

Pre­ocu­pa-me as moti­vações que lev­am advo­ga­dos, de uns anos a esta data, a dese­jarem ocu­par car­gos na OAB, inscreven­do-se para com­por o con­sel­ho. Sem­pre se teve pre­sente que tais pos­tu­lações pos­suíam jus­ti­fica­ti­vas den­tro dos lim­ites traça­dos pela von­tade de servir a cat­e­go­ria e a própria sociedade. Havia enga­ja­men­to em um rol de ideias e de ideais, que con­sti­tuíam um ideário a ser segui­do. As vari­ações deter­mi­navam as opções por esse ou aque­le grupo.

Na real­i­dade, a políti­ca de classe sem­pre foi pau­ta­da pela crença da advo­ca­cia como um meio de aper­feiçoa­men­to do Poder Judi­ciário, como agente trans­for­mador da sociedade e como instru­men­to efi­caz para a con­strução de um País mel­hor.

O can­dida­to à ordem se apre­sen­ta­va imbuí­do da mis­são de se tornar um por­ta-voz das aspi­rações de uma sociedade car­ente de alter­ações sub­stan­ci­ais em suas estru­turas, bem como dos anseios de uma advo­ca­cia em crise neces­si­ta­da de val­oriza­ção e de respeito por parte do cor­po social, da impren­sa e do próprio Poder Judi­ciário.

Deve-se ano­tar que os advo­ga­dos, his­tori­ca­mente, sem­pre ado­taram pos­turas impeli­dos pelo incon­formis­mo e pelo ardente anseio de apri­mora­men­to, fato que nos colo­cou no cen­tro da dinâmi­ca das mudanças insti­tu­cionais e soci­ais.

Percebe-se que na atu­al­i­dade há um ind­is­farçáv­el dese­jo de pro­tag­o­nis­mo pes­soal, de prestí­gio e de aplau­sos. São os inter­ess­es indi­vid­u­ais sub­sti­tuin­do os de natureza cole­ti­va. Estes, como se viu, servi­ram de per­ma­nente moti­vação para os diri­gentes da advo­ca­cia, o que me parece não mais ocor­rer, pelo menos com parte dos que se habili­tam a diri­gir a OAB.

A opção por esse ou aque­le grupo parece se dar basi­ca­mente em função do car­go ou da posição ofer­e­ci­dos na gestão. Pouco impor­ta o pro­gra­ma a ser exe­cu­ta­do; deixa-se de lado a fidel­i­dade aos gru­pos a que se per­tenceu e pouco impor­tam tam­bém aspec­tos de cono­tação ide­ológ­i­ca. Tam­bém se leva em con­ta para a escol­ha da cha­pa aque­la que se apre­sen­ta com maior via­bil­i­dade eleitoral.

Uma obser­vação: há inúmeros advo­ga­dos que pode­ri­am dar valiosa con­tribuição à classe e à sociedade. No entan­to, se omitem exata­mente porque não com­par­til­ham dos obje­tivos exclu­si­va­mente pes­soais, des­viantes da mis­são que dev­e­ri­am cumprir em prol do apri­mora­men­to da advo­ca­cia.

Eu ter­mi­no este escrito salien­tan­do que a grandeza da advo­ca­cia não per­mite que a nos­sa enti­dade seja con­sid­er­a­da um clube recre­ati­vo, uma ação entre ami­gos ou um espaço para real­iza­ções pes­soais. Ela deve ser trata­da como um tem­p­lo ded­i­ca­do ao cul­to da liber­dade e do human­is­mo.