José Raimundo Gomes da Cruz Titular da Cadeira 48 – Alfredo de Araújo Lopes da Costa Procurador de Justiça de São Paulo aposentado.
Dedicatória de Rose a sua “filha Rosemary e outras pessoas como ela, de mente retardada, mas de espírito abençoado. Minha visão é um mundo em que o retardamento mental será dominado, em que não mais choraremos com as mães de crianças retardadas; mas exultaremos e nos regozijaremos com os pais de jovens sadios e felizes.” (Rose Fitzgerald Kennedy. A saga dos Kennedy Trad. Carlos Nayfeld, Jorge Arnaldo Fortes e Arnaldo Viriato de Medeiros. 2a edição. Rio de Janeiro : Arte Nova, 1977).
Como o cinema jamais se omitiu sobre temas importantes, o Google se refere ao filme “Os agentes do destino”, com Matt Damon e Emily Blunt: David (Damon) tenta proteger a amada e reverter uma cadeia de lobotomia parcial à sua volta.
Também no Google: De Repente, No Último Verão (Suddenly, Last Summer, 1959) é, com certeza, o filme mais definitivo a respeito da obra de Tennessee Williams. Se alguém quiser um dia entender tudo o que envolve a obra do dramaturgo, encontrará neste filme/peça todos os elementos mais usados por ele, sem exceções. É também nele que podemos encontrar as maiores referências à vida pessoal de Tennessee, já que cada personagem presente representa um membro da família dele. A trama é forte e pesada, carregando em si elementos difíceis que geralmente nunca dividem espaço numa mesma obra. Elizabeth Taylor, mais linda e talentosa do que nunca, encara o difícil papel de Catherine Holly, uma garota que sofre um trauma enorme depois de uma viagem à África, em que vê seu amigo, por quem era secretamente apaixonada, ser devorado por nativos. O tal amigo, na verdade, era gay e flertou com tais nativos, desencadeando assim a tragédia. Agora de volta para casa ela acaba bloqueando esse episódio de sua memória e praticamente enlouquece. Sua rica tia, Violet Venable (Katharine Hepburn), temerosa de que Catherine conte para alguém o ocorrido, contrata o neurologista Dr. Cukrowicz (Montgomery Clift) para realizar na moça uma lobotomia. No entanto, o médico acaba se interessando verdadeiramente pelo passado de Catherine e decide ajudá-la sem o procedimento cirúrgico que certamente a deixaria incapacitada. Temos aqui um conjunto de tudo que fez a vida de Williams ser como era: ele escreveu essa trama logo após uma desilusão amorosa com uma mulher e, por causa disso, se descobriu homossexual. Depois temos a personagem de Catherine, que representa Rose, a irmã de Tennessee, que também era taxada de louca e sofreu uma lobotomia autorizada pelos próprios pais. Violet é um tipo de representação dos pais duros e insensíveis de Williams, que só se preocupavam com as aparências. E, por último, temos o neurologista, que representa a salvação de Caherine, aquele que acredita que ela não é louca e se apaixona por ela. Ele é aquilo que Tennessee gostaria que tivesse acontecido no seu caminho e no de sua irmã. O filme foi indicado em três categorias do Oscar, inclusive Katahrine Hepburn e Elizabeth Taylor competiram pela estatueta de Melhor Atriz.
De 1975, o filme O estranho no ninho (One flew over the cuckoo’s nest), do diretor Milos Forman, com Jack Nicholson e Louise Fletcher, narra a história do preso transferido para centro de tratamento psíquico. Como se trata de indivíduo de grande atividade, a diretora do estabelecimento acaba valendo-se da lobotomia para controlá-lo.
Lobotomia, em inglês lobotomy, volta à capa da revista People, de 14/9/15: “The Hidden Kennedy”. Subtítulo ainda na capa, com foto de jovem atraente e elegante: “A linda irmã de JFK Rosemary lobotomizada com 23 anos de idade. – Por que ela era vista como ameaça – e abandonada numa instituição de caridade por décadas. – Como sua trágica vida ainda persegue uma dinastia.” Tópicos da capa: “O segredo mais sombrio da família”, sobre foto menor de JFK e da atraente irmã Rosemary em 1935. Enfim, a observação: “2 novos livros revelam toda a chocante verdade”. Dicionários de lá e daqui não registram o verbo to lobotomize ou seu equivalente em português.
Entre as várias definições de lobotomia, prefiro a do Dicionário Escolar da Língua Portuguesa – da Academia Brasileira de Letras: “Antigo tratamento da esquizofrenia que consistia no corte do lobo frontal do cérebro” (2. ed. São Paulo : Cia. Ed. Nacional, 2008).
Pessoas famosas que foram submetidas a lobotomia segundo o Google: Josef Hassid, violinista polonês prodígio e esquizofrênico, faleceu aos 26 anos de idade; Rosemary Kennedy, irmã de John F. Kennedy, passou por uma lobotomia em 1941, aos 23 anos, que a deixou permanentemente incapacitada; Rose Williams, irmã mais velha do dramaturgo Tennessee Williams; Howard Dully, que escreveu um livro com suas memórias, quando descobriu que tinha sido lobotomizado em 1960, aos 12 anos; Sigrid Hjertén, pintora sueca que morreu após a lobotomia, em 1948.
Voltando ao tema principal deste texto – a filha escondida da família Kennedy – a reportagem assinada por Elizabeth McNeil, ilustrada com várias fotos, acha-se nas páginas 52 a 58 da revista People já citada. Subtítulo do texto: “Mais de 7 décadas após a problemática irmã Rosemary de JFK ficar incapacitada por uma desastrosa lobotomia, 2 novos livros revelam dolorosos detalhes do mais escuro segredo de uma dinastia”. Segundo subtítulo: “Nas fotos ela se parece em cada detalhe a Kennedy perfeita: radiante, sardenta, destinada a uma vida de encanto. Mas a verdade sobre Rosemary, a terceira dos nove filhos de Rose e Joseph Kennedy, era muito mais obscura do que parecia. Nascida com incapacidades intelectuais, como seus pais estavam decididos a guardar segredo, ela lutou para nivelar-se com seus parentes altamente competitivos. E quando ela se tornou mais difícil de controlar – e sexualmente atraente – seu pai a submeteu a uma lobotomia, com a idade de 23 anos, que a deixou com a capacidade mental de uma criança que aprende a andar. Após a cirurgia, ela foi escondida do público em Santa Coletta, escola católica para mentalmente incapazes, em Jefferson, Wis. – um destino aparentemente guardado dos parentes próximos por duas décadas. Agora, pela primeira vez, sua história completa está contada. Em The Missing Kennedy… Elizabeth Koehler-Pentacoff revela memórias de visitas a Rosemary em Sr. Coletta, onde a tia de Koehler-Pentacoff era uma das freiras que cuidavam dela. Kate Clifford Larson teve acesso a novas fontes históricas para seu livro Rosemary: The Hidden Kennedy daughter (condensado aqui). Juntas as biografias pintam um devastador retrato de uma frágil vida ceifada logo. ‘Lendo as cartas dela, você vê quão amável Rosemary era,’ Larson diz. ‘Ela era uma maravilhosa criança que caiu vítima da época e das ambições de uma poderosa família. É bem trágico’.”
Numa época em que tanto se discute sobre vantagens de partos feitos na residência da futura mãe, e não em maternidade ou simples hospital, na falta daquela, convém destacar o início da matéria assinada por E. McNeil: “Em 13 de setembro de 1918, Rose Kennedy entrou em trabalho de parto. Sua enfermeira chamou o obstetra para vir à casa da família em Brookline, Mass., mas o doutor estava atrasado. Treinada para não completar partos sem um médico presente (em parte, talvez, porque a remuneração dele só era paga com a presença dele para o parto) a enfermeira tomou uma decisão fatal. Ela tentou manter Rose calma, encorajando‑a a lutar contra o impulso do nascimento do bebê. Era bem compreensível que, evitando-se o movimento do bebê através do canal de nascimento, pudesse causar falta de oxigênio, expondo o nascituro a possível dano cerebral. Logo a enfermeira solicitou a Rose para manter suas pernas bem juntas na esperança de protelar o nascimento do bebê. Quando isso falhou, a enfermeira recorreu a outro expediente ainda mais perigoso: segurar a cabeça do bebê e forçá-la de volta para dentro do canal de nascimento durante duas torturantes horas. Quando o doutor finalmente chegou, ‘uma vistosa menina foi acrescentada à enfermaria’, como The Boston Globe anunciou. Aparentemente saudável ao nascer, Rosemary logo começou a apresentar sinais preocupantes.”
Com o passar do tempo, as coisas foram piorando. Com o início da 2a guerra mundial, o embaixador dos EUA na Inglaterra, Joe Kennedy, regressou ao seu país. Rosemary tornava- se “crescentemente perturbada e difícil de ser controlada”. Ao mesmo tempo, achava-se linda, no seu sorriso, em suas poses. Para seus pais, sexualmente perigosa. Já preocupado com a carreira política dos seus filhos, Joe Kennedy temia uma gravidez indesejada.
No começo de 1941, por iniciativa paterna, a família cuidou de saber mais sobre a então recente lobotomia. Parece que só o chefe da família estava convencido da necessidade da cirurgia, da qual Rosemary saiu “quase completamente incapacitada”. Isso atingia seus braços e suas pernas. Joe Kennedy nunca mais viu Rosemary. No começo dos anos 60, quando Joe ficou incapacitado por um ataque cardíaco, os parentes nada sabiam sobre o destino tomado por Rosemary.
A verdade de toda a história da importante família começou a aparecer em 1962, com a revelação de Eunice, irmã de JFK, e mesmo da mãe destes. Mas não toda a verdade, segundo McNeil, que acrescenta: A mente de Rosemary “se foi completamente” – informou a mãe, que faleceria em 1995, ao seu biógrafo Robert Coughlan, em 1972: “Mas isso foi devido a um acidente que eu realmente não discuto.” Rose contou a Coughlan que “a sobrevivência de Rosemary e a perda de três dos seus filhos “é um enigma… por que Deus levou três filhos que estavam bem formados e queriam trabalhar pela… humanidade, e deixou minha filha que está incapacitada? Mas, como eu disse, esta é uma daquelas coisas sobre a vida…os desígnios de Deus, nós nem sempre podemos entender.”
Escolhi acima a definição de lobotomia, como antigo tratamento da esquizofrenia. Mas a imprensa tem divulgado consistente retorno ao passado dos partos caseiros, sob os cuidados de parteiras. No presente caso, nem se tratava de uma destas, mas de enfermeira.
Nas emergências, tão frequentes nos partos e quaisquer procedimentos cirúrgicos, convém o ambiente e todo equipamento humano e material das casas de saúde, particularmente das especializadas.