Naquela mesa faltou Milton Nascimento, e isto está doendo em nós

Crôni­ca de Matilde Ribeiro, pub­li­ca­da no Jor­nal “O POVO” , Ceará, em 14 de fevereiro de 2025

 

Causa indig­nação que um dos artis­tas mais influ­entes da músi­ca mundi­al, não ten­ha sido con­sid­er­a­do “impor­tante o sufi­ciente” para se sen­tar entre os out­ros prin­ci­pais indi­ca­dos. O ocor­ri­do no Gram­my não é ape­nas uma gafe

Nem sem­pre a história é con­struí­da pelo efe­ti­vo recon­hec­i­men­to do que é jus­to, viven­ci­amos isto quan­do em 2 de fevereiro de 2025, em Los Angeles/EUA, foi indi­ca­do para a 67ª edição do Gram­my Awards, o brasileirís­si­mo Miton Nasci­men­to como o Mel­hor Álbum Vocal de Jazz, em con­jun­to com a norte amer­i­cana Esper­an­za Spald­ing (can­to­ra, com­pos­i­to­ra e con­tra­baix­ista). No entan­to, a ela foi des­ti­na­do lugar na mesa, entre os prin­ci­pais artis­tas, enquan­to para ele, foi des­ti­na­da a arquiban­ca­da.

Causa indig­nação que um dos artis­tas mais influ­entes da músi­ca mundi­al, não ten­ha sido con­sid­er­a­do “impor­tante o sufi­ciente” para se sen­tar entre os out­ros prin­ci­pais indi­ca­dos. O ocor­ri­do no Gram­my não é ape­nas uma gafe, é sim uma situ­ação absur­da e ina­ceitáv­el, reflexo de exclusão com o que é con­sid­er­a­do “pop­u­lar” e ter­ceiro-mundista. Mas por out­ro lado, isto con­tribuiu para des­mas­carar o mer­ca­do cul­tur­al glob­al, demon­stran­do pequinês diante do gigante que é Mil­ton Nasci­men­to.

Na cer­imô­nia do Gram­my, Mil­ton Nasci­men­to se ausen­tou, porém com elegân­cia e altivez, ofer­tan­do uma nota explica­ti­va. Esper­an­za Spald­ing com­pare­ceu com um car­taz com a foto de Mil­ton e destaque da frase “This liv­ing leg­end shoud be seat­ed here”. Em bom por­tuguês, “Esta len­da viva dev­e­ria estar sen­ta­da aqui”.

A orga­ni­za­ção do Gram­my por mais se des­culpe, não con­seguirá apa­gar a mácu­la deix­a­da pelo desre­speito com o nos­so ícone. O Min­istério da Cul­tura do Brasil lançou nota de repú­dio. Nós brasileiras/os amantes da músi­ca e cul­tura de qual­i­dade, for­ja­da nos clubes das esquinas, trav­es­sias e can­teiros da vida, deve­mos repe­tir jun­to com Esper­an­za: “Esta len­da viva dev­e­ria estar sen­ta­da aqui”.

Não podemos esque­cer que Mil­ton Nasci­men­to com voz e inter­pre­tação úni­cas e incom­paráveis, foi “bar­ra­do no baile” do Gram­my, mas con­tin­ua nos estim­u­lan­do a ter fé na vida, ter força, ter gar­ra e sem­pre estar onde o povo está!

É impor­tante que val­orize­mos que a voz de Mil­ton Nasci­men­to ecoa pelo mun­do, tan­to quan­to as vozes de — Ste­vie Won­der, de Diana Ross, de Tina Turn­er, de Whit­ney Hous­ton. Emb­o­ra o álbum Mil­ton + Esper­an­za, não ten­ha con­quis­ta­do o prêmio, a indig­nação que ficou no ar, não é em função do resul­ta­do da pre­mi­ação.

Reg­istremos que o nos­so negro Mil­ton Nasci­men­to não depende em nada deste prêmio para ser glo­rioso. Já foi con­sagra­do pelo Mor­ro Vel­ho, pelas Marias, pelas Minas Gerais e pelas ener­gias dos que apre­ci­am o belo e a vida. Já venceu um Gram­my Awards em 1998, e rece­beu inúmeros prêmios nacionais e inter­na­cionais que atrav­es­sam ger­ações e fron­teiras.

Diante de tudo isto, é impor­tante fris­ar que não nos calaram, des­de as sen­za­las, dos açoites, das exclusões. E, não nos calarão ago­ra, em pleno sécu­lo XXI. Feliz do país que têm um Mil­ton Nasci­men­to, com sua mem­o­ráv­el e ina­baláv­el obra, que é a nos­sa VOZ potente do Brasil para o mun­do!