Em impor­tante arti­go, pub­li­ca­do no Jor­nal Brasil Pop­u­lar, em sua col­u­na O Dire­ito Acha­do na Rua, o Pro­fes­sor José Ger­al­do de Sousa Junior, que foi Reitor da Uni­ver­si­dade de BrasíliaUnB e dis­cípu­lo do saudoso Pro­fes­sor Rober­to Lyra Fil­ho, dis­cute a ação penal ora acol­hi­da no Supre­mo Tri­bunal Fed­er­al, após tra­bal­ho de inves­ti­gação da Polí­cia Fed­er­al e denún­cia do Min­istério Públi­co Fed­er­al, afor­man­do que o STF se cre­den­cia como garante da democ­ra­cia brasileira.

Leia a seguir.

Julgar crimes contra o Estado de Direito credencia o STF como garante da democracia

José Geraldo de Sousa Jr (*)

Neste 26/3, a Primeira Tur­ma do Supre­mo Tri­bunal Fed­er­al (STF) decid­iu, por una­n­im­i­dade, aceitar a denún­cia con­tra o ex-pres­i­dente Jair Bol­sonaro e sete de seus asso­ci­a­dos, tor­nan­do-os réus em um proces­so penal.

Na denún­cia apre­sen­ta­da pela Procu­rado­ria-Ger­al da Repúbli­ca (PGR) ao Supre­mo Tri­bunal Fed­er­al (STF), o ex-pres­i­dente Jair Bol­sonaro e os demais inte­grantes do chama­do “núcleo cru­cial” foram acu­sa­dos dos seguintes crimes:​ Orga­ni­za­ção crim­i­nosa arma­da: for­mação de grupo estru­tu­ra­do com o obje­ti­vo de come­ter crimes uti­lizan­do armas; ten­ta­ti­va de abolição vio­len­ta do Esta­do Democráti­co de Dire­ito por meio de vio­lên­cia ou grave ameaça, impedin­do ou restringin­do o exer­cí­cio dos poderes con­sti­tu­cionais; Golpe de Esta­do: ten­ta­ti­va de depor, por meio de vio­lên­cia ou grave ameaça, o gov­er­no legit­i­ma­mente con­sti­tuí­do;​ dano qual­i­fi­ca­do: destru­ição, inuti­liza­ção ou dete­ri­o­ração de bens públi­cos, espe­cial­mente quan­do há emprego de vio­lên­cia ou ameaça; e dete­ri­o­ração de patrimônio tomba­do: danos cau­sa­dos a bens pro­te­gi­dos por seu val­or históri­co, artís­ti­co ou cul­tur­al.​

Ess­es crimes estão rela­ciona­dos às ações que visavam impedir a posse do pres­i­dente eleito Luiz Iná­cio Lula da Sil­va após as eleições de 2022. Se con­de­na­dos, os réus podem enfrentar penas de até 43 anos de prisão. ​

Além do ex-pres­i­dente Bol­sonaro, a decisão aceitou a denún­cia con­tra Wal­ter Bra­ga Net­to: gen­er­al do Exérci­to, ex-min­istro da Casa Civ­il e can­dida­to a vice-pres­i­dente na cha­pa de Bol­sonaro nas eleições de 2022; Augus­to Heleno: gen­er­al do Exérci­to e ex-min­istro do Gabi­nete de Segu­rança Insti­tu­cional (GSI); Alexan­dre Ram­agem: ex-dire­tor da Agên­cia Brasileira de Inteligên­cia (Abin); Ander­son Tor­res: ex-min­istro da Justiça e ex-secretário de Segu­rança Públi­ca do Dis­tri­to Fed­er­al; Almir Gar­nier: ex-coman­dante da Mar­in­ha; Paulo Sér­gio Nogueira: gen­er­al do Exérci­to e ex-min­istro da Defe­sa; e Mau­ro Cid: tenente-coro­nel e ex-aju­dante de ordens do ex-pres­i­dente Jair Bol­sonaro.​

Além do “núcleo cru­cial” da orga­ni­za­ção crim­i­nosa, a Procu­rado­ria-Ger­al da Repúbli­ca (PGR) iden­ti­fi­cou out­ros qua­tro núcleos na denún­cia apre­sen­ta­da con­tra o ex-pres­i­dente Jair Bol­sonaro e seus asso­ci­a­dos, arrolan­do uma nom­i­na­ta de quadros de alta hier­ar­quia civ­il e mil­i­tar, com­preen­den­do imputações de “coor­de­nação do emprego das forças poli­ci­ais para sus­ten­tar a per­manên­cia ilegí­ti­ma do ex-pres­i­dente no poder: Este grupo, com­pos­to por seis inte­grantes, tin­ha a função de coor­denar o uso de forças poli­ci­ais ou mil­itares em oper­ações plane­jadas pelo núcleo políti­co”;  “dis­sem­i­nação de desin­for­mação: Com­pos­to por oito inte­grantes, este núcleo era respon­sáv­el por oper­ações estratég­i­cas de desin­for­mação, pro­pa­gan­do notí­cias fal­sas sobre o proces­so eleitoral e real­izan­do ataques vir­tu­ais a insti­tu­ições e autori­dades”; “ações táti­cas para con­vencer e pres­sion­ar o Alto Coman­do do Exérci­to a ulti­mar o golpe: Este grupo de sete mil­itares tin­ha como obje­ti­vo exe­cu­tar ações táti­cas para con­vencer e pres­sion­ar o Alto Coman­do do Exérci­to a con­sumar o golpe”; e “mon­i­tora­men­to e neu­tral­iza­ção de autori­dades públi­cas: Com­pos­to por cin­co mil­itares, este núcleo era respon­sáv­el por mon­i­torar e neu­tralizar autori­dades públi­cas”.

Essa divisão em “núcleos” foi real­iza­da pela PGR para otimizar o anda­men­to proces­su­al e facil­i­tar a análise dos casos pela Justiça, e em pro­ced­i­men­tos especí­fi­cos pas­sarão nos próx­i­mos dias pelo mes­mo juí­zo de aceitação das denún­cias respec­ti­vas, tam­bém na 1ª Tur­ma do STF, ao exame dos mes­mo min­istros jul­gadores.

Ago­ra que a denún­cia foi acei­ta, por una­n­im­i­dade, os acu­sa­dos pas­sam a ser réus no proces­so crim­i­nal, cujo prossegui­men­to per­corre as seguintes eta­pas: Citação dos Réus – Os acu­sa­dos serão for­mal­mente noti­fi­ca­dos para apre­sen­tar suas defe­sas por escrito den­tro do pra­zo legal; Instrução Proces­su­al – Nes­ta fase, serão pro­duzi­das provas, real­izadas oiti­vas de teste­munhas de acusação e defe­sa, além do inter­ro­gatório dos réus; jul­ga­men­to pelo STF, após a fase de instrução do proces­so, poden­do os réus, se con­de­na­dos, apre­sen­tar os recur­sos cabíveis den­tro do próprio tri­bunal. A Exe­cução da Pena (se hou­ver con­de­nação) será defini­da decisão final do STF, poden­do incluir prisão e out­ras penal­i­dades.

No STF, a ação penal con­tra o ex-pres­i­dente Jair Bol­sonaro e os demais réus será pre­si­di­da pelo rela­tor do caso, que é o min­istro Alexan­dre de Moraes. Ao min­istro rela­tor com­pete o papel fun­da­men­tal de con­duzir o proces­so e de tomar diver­sas decisões ao lon­go da instrução crim­i­nal, incluin­do: super­vi­sion­ar a fase de instrução proces­su­al, incumbindo-lhe autor­izar a cole­ta de provas, ouvir teste­munhas e deter­mi­nar diligên­cias necessárias; pre­sidir os inter­ro­gatórios con­duzin­do os depoi­men­tos dos réus e das teste­munhas, garan­ti­n­do que todas as partes sejam ouvi­das; anal­is­ar pedi­dos das partes, o que inclui requer­i­men­tos da defe­sa e do Min­istério Públi­co, como solic­i­tações para inclusão de provas ou impug­nação de doc­u­men­tos; deter­mi­nar medi­das caute­lares,  poden­do impor restrições aos réus, como proibição de con­ta­to entre eles, blo­queio de bens ou até prisão pre­ven­ti­va, se necessário; e encam­in­har o caso para jul­ga­men­to cole­gia­do,  após a fase de instrução, com seu relatório e voto.

Real­iza­do o jul­ga­men­to, nele os min­istros deci­dem se os réus são inocentes ou cul­pa­dos. Se os mag­istra­dos optarem pela con­de­nação, os réus recebem penas de for­ma indi­vid­ual, con­forme o envolvi­men­to de cada um nos crimes. Em caso de inocên­cia, o proces­so é arquiv­a­do.

Ao aceitar a denún­cia o STF não exerce ape­nas uma atribuição téc­ni­co-jurídi­ca mas se cre­den­cia para exercer con­sti­tu­cional­mente a função de garante da Democ­ra­cia e de guardião da Con­sti­tu­ição. Do pon­to de vista téc­ni­co a exten­são e inten­si­dade do relatório e votos, do rela­tor e dos min­istros da Tur­ma, causam impacto e estu­por. A dinâmi­ca da con­trafação, do lesa-pátria expõe a tra­ma de uma con­spir­ação golpista, aliás, não con­tra­di­ta pelas defe­sas que se con­cen­traram no esforço vão e con­tra­ditório entre si, de descar­ac­teri­zar os enquadra­men­tos evi­dentes, à luz das provas, dos depoi­men­tos e dos fatos encon­tra­dos sob a guar­da dos agentes dos deli­tos.

Do pon­to de vista políti­co e no lim­ite éti­co, uma exposição didáti­ca e rev­e­lado­ra de uma agressão às insti­tu­ições, à democ­ra­cia, ao esta­do de dire­ito, à sociedade e à con­sti­tu­ição do país. Aqui mes­mo, neste espaço em reg­istros da Col­u­na O Dire­ito Acha­do na Rua (https://brasilpopular.com/autoanistia-uma-violencia-inconstitucional-e-inconvencionaldo-delinquente-a-fim-gerar-sua-impunidade/; tam­bém em  https://brasilpopular.com/60-anos-do-golpe-de-1964-memoria-verdade-mas-tambem-justica-razoes-para-o-nunca-mais/ten­ho exter­na­do a expec­ta­ti­va de que tudo que se viven­cia no país des­de o 8 de janeiro de 2023 deve ser avali­a­do sob o enfoque da Justiça Tran­si­cional, até para que se real­ize o seu fun­da­men­to de não repetição, uma vez que a delin­quên­cia de hoje é resul­tante dire­ta da delin­quên­cia de ontem porque não se respon­s­abi­li­zou os con­tra­ven­tores rein­ci­dentes.  E isso sig­nifi­ca dev­er-se estar aten­tos, inclu­sive os tri­bunais, às reit­er­adas man­i­fes­tações da Comis­são e da Corte Inter­amer­i­cana de Dire­itos Humanos sobre esta­b­ele­cer que a fal­ta de respon­s­abi­liza­ção e  as dis­posições de anis­tia ampla, abso­lu­ta e incondi­cional con­sagram a impunidade em casos de graves vio­lações dos dire­itos humanos, pois impos­si­bili­tam uma inves­ti­gação efe­ti­va das vio­lações, a per­se­cução penal e sanção dos respon­sáveis. A Comis­são afir­mou que ess­es crimes têm uma série de car­ac­terís­ti­cas difer­en­ci­adas do resto dos crimes, em vir­tude dos fins e obje­tivos que perseguem, den­tre eles, o con­ceito da humanidade como víti­ma, e sua função de garan­tia de não repetição de aten­ta­dos con­tra a democ­ra­cia e de atro­ci­dades inesquecíveis. Especi­fi­ca­mente sobre o mon­i­tora­men­to que exerci­ta em relação ao Brasil, a Comis­são Inter­amer­i­cana de Dire­itos Humanos (CIDH), em seu últi­mo relatório (2021), ofer­e­ceu recomen­dações sobre ações que ten­dem a frag­ilizar e até extin­guir esse sis­tema, como o enfraque­c­i­men­to dos espaços de par­tic­i­pação democráti­ca, indi­can­do, entre as recomen­dações, a neces­si­dade de “inves­ti­gar, proces­sar e, se deter­mi­na­da a respon­s­abil­i­dade penal, san­cionar os autores de graves vio­lações aos dire­itos humanos, abs­ten­do-se de recor­rer a fig­uras como a anis­tia, o indul­to, a pre­scrição ou out­ras exclu­dentes inaplicáveis a crimes con­tra a humanidade”, pre­venin­do o nun­ca mais.

Falan­do para o pro­gra­ma Lat­i­tud Brasil, em entre­vista para TeleSur, em pro­gra­ma anco­ra­do pelo jor­nal­ista Beto Almei­da, pudemos con­ver­gir que o jul­ga­men­to deste dia 26 de março e aber­tu­ra do proces­so crim­i­nal podem se con­sti­tuir numa lição de cidada­nia, numa sessão espe­cial e pedagóg­i­ca para o apren­diza­do da democ­ra­cia e de real­iza­ção de justiça (de tran­sição). Uma chance para que pos­samos exerci­tar um apren­diza­do de reed­u­cação políti­ca, uma aula práti­ca de dis­cern­i­men­to sobre a hipocrisia e o fas­cis­mo dos dis­cur­sos que pare­cen­do avança­dos e pro­gres­sis­tas não dis­farçam, sal­vo pela pro­va da práti­ca, posi­ciona­men­tos, cumpli­ci­dades, diver­sion­is­mos, camu­fla­gens de enga­ja­men­tos ide­ológi­cos sobre proces­sos soci­ais, con­ceitos econômi­cos e políti­cos, práti­cas con­fes­sion­ais e falá­cias argu­men­ta­ti­vas.

Mau­rice Mer­leau-Pon­ty adver­tia para o dis­farce lin­guís­ti­co que ocul­ta as inten­cional­i­dades e as alianças. Ele dizia que dis­cur­si­va­mente, “todos defen­d­em os mes­mos val­ores, a liber­dade, a justiça, a igual­dade; então o que sep­a­ra; o que sep­a­ra são as asso­ci­ações que esta­b­ele­ce­mos, se com os sen­hores ou se com os escravos”.  Na sua con­sid­er­ação, val­ores como liber­dade, justiça, igual­dade, são con­quis­tas real­izadas pelo social no mun­do, enfa­ti­zan­do a inter­ação entre o indi­ví­duo e o con­tex­to social. Para ele temos respon­s­abil­i­dade cole­ti­va e indi­vid­ual em relação aos val­ores uni­ver­sais e como difer­entes inter­pre­tações dess­es val­ores podem levar a asso­ci­ações dis­tin­tas, refletindo sobre a com­plex­i­dade das escol­has humanas e suas impli­cações políti­cas.

Foi, no mín­i­mo curioso con­statar a irres­ig­nação dos réus, prin­ci­pal­mente do ex-pres­i­dente – aque­le jus­ta­mente que o min­istro-rela­tor con­sider­ou como se ouviu em seu relatório​, como “o líder de uma orga­ni­za­ção crim­i­nosa que plane­jou e executou ações visan­do impedir a posse do pres­i­dente eleito Luiz Iná­cio Lula da Sil­va e abolir o Esta­do Democráti­co de Dire­ito no Brasil; que não ape­nas tin­ha con­hec­i­men­to das ações golpis­tas, mas tam­bém par­ticipou ati­va­mente de seu plane­ja­men­to e exe­cução”;  indi­can­do, “entre as evidên­cias apre­sen­tadas, destacar-se uma min­u­ta de decre­to pres­i­den­cial que pre­via a dec­re­tação de Esta­do de Defe­sa no Tri­bunal Supe­ri­or Eleitoral (TSE) e a prisão do min­istro Alexan­dre de Moraes”; e que, “de acor­do com a inves­ti­gação”, o ex-pres­i­dente “teria pes­soal­mente ajus­ta­do essa min­u­ta e pres­sion­a­do os coman­dantes das Forças Armadas a aderirem ao plano”. Com­ple­tan­do que ​“além dis­so, o relatório indi­ca que Bol­sonaro esta­va ciente de planos para assas­si­nar o pres­i­dente eleito Lula, o vice-pres­i­dente Ger­al­do Alck­min e o próprio min­istro Alexan­dre de Moraes. Essas infor­mações foram cor­rob­o­radas por depoi­men­tos e evidên­cias cole­tadas durante a inves­ti­gação” – uma insis­tente pos­tu­ra de desqual­i­fi­cação do sis­tema de justiça, do Min­istério Públi­co, do pro­ced­i­men­to judi­cial, con­fig­u­ran­do como o ex-pres­i­dente Jair Bol­sonaro tem con­sis­ten­te­mente car­ac­ter­i­za­do as inves­ti­gações e proces­sos judi­ci­ais con­duzi­dos pelo Supre­mo Tri­bunal Fed­er­al (STF) e pelo Min­istério Públi­co como for­mas de perseguição políti­ca. Em respos­ta às acusações de envolvi­men­to em uma ten­ta­ti­va de golpe de Esta­do, ele insiste em negar qual­quer irreg­u­lar­i­dade e con­tin­uan­do a desqual­i­ficar as insti­tu­ições, a afir­mar ser víti­ma de uma “caça às bruxas políti­ca” des­ti­na­da a impedir seu retorno ao poder antes das eleições pres­i­den­ci­ais de 2026, porque as acusações têm como obje­ti­vo encer­rar sua car­reira políti­ca e suprim­ir a oposição de dire­i­ta. ​

No extremo, tem com­para­n­do proces­sos no STF a práti­cas “nazi-fascis­tas” (a con­ferir 1. UOL – Títu­lo: “Bol­sonaro chama proces­so no STF de ‘práti­ca nazi-fascista’” Link: https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2023/10/23/bolsonaro-stf-nazifascista.htm; 2. G1 (Globo) – Títu­lo: “Bol­sonaro crit­i­ca STF e fala em ‘nazi-fas­cis­mo’ em post sobre proces­sos”. Link: https://g1.globo.com/politica/noticia/2023/10/23/bolsonaro-critica-stf-e-fala-em-nazi-fascismo-em-post-sobre-processos.ghtml;  3. Fol­ha de S.Paulo – Títu­lo: “Bol­sonaro ata­ca STF e chama proces­sos de ‘práti­ca nazi-fascista’”. Link: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2023/10/bolsonaro-ataca-stf-e-chama-processos-de-pratica-nazi-fascista.shtml .

Com­preende-se a des­façatez de atribuir a out­ros a ati­tude ou a práti­ca que traduz o seu modo de agir políti­co. Mas esse não é o rabo visív­el que rev­ela o gato escon­di­do. Esse é tam­bém um modo mer­leau-pontyano de desve­lar e de anal­is­ar e com­preen­der os sub-tex­tos, os suben­ten­di­dos, aque­les ele­men­tos pre­sentes nas nar­ra­ti­vas – dos edi­to­ri­ais e comen­tários apre­sen­ta­dos nos grandes meios de comu­ni­cação (ah, o exces­so gen­er­al­izáv­el da tip­i­fi­cação para a inter­venção ingênua de batom nos sím­bo­los e bens pat­ri­mo­ni­ais ou a prom­e­nade domini­cal de vel­hin­has com bíblias nas mãos), do púl­pi­to, con­ver­tido em palanque, para o farisaís­mo moral­ista e intol­er­ante em redução pas­toral e teológ­i­ca; da tri­buna, na locução de uma rep­re­sen­tação que se res­guarde na cara­puça da imu­nidade par­la­men­tar para acober­tar a cumpli­ci­dade finan­cia­da do exer­cí­cio de mandatos; na cát­e­dra, cap­tura­da pelo nega­cionis­mo ou cop­ta­da pelo sis­tema de pro­dução de con­hec­i­men­to pelo fomen­to que esvazia a função social da edu­cação; da judi­catu­ra, enfim, quan­do con­vo­ca­da para reve­stir de lic­i­tude o ignó­bil e o “obscuro cam­in­ho” lem­bra­va o padre Hen­rique Cláu­dio de Lima Vaz, ao se referir “a hor­da sem lei” (cf. Éti­ca e Justiça: Filosofia do Agir Humano in PINHEIRO, pe José Ernanne, SOUSA JUNIOR, José Ger­al­do de, DINIS, Melil­lo, SAMPAIO, Plínio de Arru­da (orgs). Éti­ca, Justiça e Dire­ito. Reflexões sobre a Refor­ma do Judi­ciário. Petrópo­lis: CNBB/Editora Vozes. 1ª edição, 1996); ou a própria desleal­dade com o social mobi­liza­do enganosa­mente por expec­ta­ti­vas vicárias dis­farçadas de defe­sa do bem comum – para ir além da com­preen­são super­fi­cial das palavras e dos even­tos descritos.

Jul­gar Crimes con­tra o Esta­do de Dire­ito cre­den­cia o STF como garante da Democ­ra­cia, mas é tam­bém uma opor­tu­nidade incon­tornáv­el para aferir a nos­sa capaci­dade pedagóg­i­ca de exerci­tar uma exper­iên­cia exem­plar de edu­cação para a Democ­ra­cia e para a Cidada­nia.

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(*) José Ger­al­do de Sousa Junior é pro­fes­sor tit­u­lar na Fac­ul­dade de Dire­ito e ex-reitor da Uni­ver­si­dade de Brasília (UnB), grad­u­a­do em Ciên­cias Jurídi­cas e Soci­ais pela Asso­ci­ação de Ensi­no Unifi­ca­do do Dis­tri­to Fed­er­al – AEUDF, mestre e doutor em Dire­ito pela Uni­ver­si­dade de Brasília – UnB. É tam­bém jurista, pesquisador de temas rela­ciona­dos aos dire­itos humanos e à cidada­nia, sendo recon­heci­do como um dos autores do pro­je­to Dire­ito Acha­do na Rua, grupo de pesquisa com mais de 45 pesquisadores envolvi­dos. Pro­fes­sor da UnB des­de 1985, ocupou pos­tos impor­tantes den­tro e fora da Uni­ver­si­dade. Foi chefe de gabi­nete e procu­rador jurídi­co na gestão do pro­fes­sor Cristo­vam Buar­que; dirigiu o Depar­ta­men­to de Políti­ca do Ensi­no Supe­ri­or no Min­istério da Edu­cação; é mem­bro do Con­sel­ho Fed­er­al da Ordem dos Advo­ga­dos do Brasil – OAB, onde acu­mu­la três décadas de atu­ação na defe­sa dos dire­itos civis e de medi­ação de con­fli­tos soci­ais. Em 2008, foi escol­hi­do reitor, em eleição real­iza­da com voto par­itário de pro­fes­sores, estu­dantes e fun­cionários da UnB. É autor de, entre out­ros, Sociedade Democráti­ca (Uni­ver­si­dade de Brasília, 2007), O Dire­ito Acha­do na Rua. Con­cepção e Práti­ca 2015 (Lumen Juris, 2015) e Para um Debate Teóri­co-Con­ceitu­al e Políti­co Sobre os Dire­itos Humanos (Edi­to­ra D’Plácido, 2016).