Em artigo publicado no Jornal Valor Econômico, as Advogadas Sônia Cochrane Ráo e Natasha do Lago analisam jurisprudência e atuação do Ministério Público no tema da responsabilidade penal de empresas e de seus dirigentes, advertindo para a necessidade de abandonar as concepções simplistas e apressadas, em prol de uma compreensão mais séria, tanto do ponto de vista do estado da arte da doutrina brasileira e internacional, quanto da perspectiva garantista de direitos e deveres, que impeça a continuidade do cometimento de injustiças, com base em preconceitos.
Sônia Ráo, formada em Direito pela Universidade de São Paulo, na turma de 1983, é uma das mais respeitadas criminalistas brasileiras, sendo sócia de Ráo e Lago Advogados desde 1990.
Natasha do Lago é doutoranda e mestre em Direito Penal pela FD.USP, Professora do Insper e Conselheira e Coordenadora da Comissão de Direitos e Prerrogativas da OAB, Seção de São Paulo.
O artigo pode ser lido no Valor Econômico, neste link, sendo transcrito breve trecho a seguir.
“Criminalização da atividade empresarial no Brasil
Responsabilidade penal em empresas sempre foi tema controvertido nos tribunais brasileiros. Seja devido a releituras apressadas da famigerada “teoria do domínio do fato” — criada por jurista alemão para lidar com a responsabilidade de superiores pelos crimes praticados por subordinados durante o nazismo -, seja por presunção de onisciência impraticável em grandes corporações.
Empresários de diversos calibres são, cada vez mais, forçados a considerar riscos de direito penal ao assumirem funções. Isso sem considerar os diversos profissionais que, conhecedores dos critérios equivocados que podem levá-los a responder a processos infundados, preferem não assumir posições de liderança, criando um mecanismo de incentivo reverso que contraria a lógica empresarial.
Por definição, apenas responde por crime aquele que pratica ação ou omissão puníveis, ou concorra de algum modo para a sua prática, admitindo-se a responsabilidade da pessoa jurídica somente em crimes ambientais.
Não é qualquer omissão, todavia, que possui o efeito de gerar responsabilidade penal: somente será relevante a que partir de pessoas que, tendo conhecimento da situação que demanda intervenção, poderiam e deveriam agir para evitar o resultado. Esse dever de ação, por sua vez, incumbe àqueles que possuem obrigação legal de cuidado, proteção ou vigilância, assumem a responsabilidade de impedir o crime ou criam o risco de sua ocorrência.
(…)
A prática corrente de acusar executivos, empresários e acionistas com base em seus cargos, enfim, é tema que precisa ser debatido com a seriedade e sensibilidade necessárias pelos tribunais, sem soluções apressadas que sujeitem indefinidamente os acusados às tormentas de um processo penal.”