Nagib Slaibi magistrado substituto no TRE-RJ. Professor da Escola Judiciária Eleitoral e da UNIVERSO.
É direito do eleitor o voto secreto. É seu dever o voto consciente. O voto é igual para todos, dizem as constituições dos séculos XX, não importam as qualidades e os defeitos do eleitor.
E o voto é secreto para garantir ao eleitor, como titular da soberania popular, o direito e o dever de não expressar o motivo que o leva a dar o voto ao candidato, ou de votar em branco, anular o voto ou mesmo de se abster. Aliás, voto nulo, em branco e a abstenção são as únicas defesas do eleitor que não foi convencido ou que permaneceu desmotivado.
A ínfima multa que que lhe aplica a Justiça Eleitoral por não votar é simples aborrecimento que não o dissuade, por si só, da abstenção; o juiz pode aplicar a lei e multar o ausente, mas não tem como o obrigar a votar.
Já os eleitos, assim como os juízes e os administradores públicos, são sempre forçados a esclarecer os motivos de sua decisão. Se não o fizerem, a decisão é nula porque carece de legitimidade para ser cumprida pelo jurisdicionado e pelo administrado.
O voto é o resultado do que pensa o eleitor, e o seu pensamento é o que decorre da vivência e dos estímulos percebidos pelos sentidos. Sabedores de que o voto é imotivado e secreto, usam os interessados, lícita ou ilicitamente, os argumentos e as informações, verdadeiras ou falsas, que possam levar ao resultado por eles desejado.
Os meios de convencimento do eleitor são sempre os mesmos, não importam o tempo e a forma analógica ou digital de expressão do voto: o cochicho ao pé do ouvido, o corpo-a-corpo, o comício, a mídia, a ação entre amigos, as pressões e as ameaças e tudo o mais que possa engendrar a mente humana para o bem ou para o mal.
O que pode ser engendrado e praticado sempre ofereceu, na vida real, tão grande diversidade que o legislador sempre é incapaz de prever toda a sua gama. Por isso as leis são sempre genéricas e abstratas e contam com o juiz para apreciar a ocorrência em cada caso. E o juiz não pode se omitir em decidir sob o fundamento de lacuna ou obscuridade da lei.
O candidato e o partido, e não só eles, mas todos os interessados na eleição, têm o inegável poder de tentar convencer ou de impor cabresto ao eleitor. As pessoas de bem tem o dever de reprimir os abusos e as fraudes, de garantir o direito do titular da soberania popular de escolher quem quiser, ou até mesmo o de não escolher.
Ensinou René Descartes que a certeza da ocorrência do fato é o critério da verdade.
A verdade é o principal combustível das forças do bem para a vida ética, para atender aos interesses gerais sem desprezar a individualidade, como exige o Estado Democrático de Direito.
A Justiça Eleitoral foi criada pela Constituição de 1934 justamente para garantir a verdade do voto direto e secreto.
Criaram a Justiça Eleitoral, com juízes e promotores concursados e independentes do Governo e das demais forças políticas, sociais e econômicas, porque constataram que na Colônia, no Império e na República Velha quem organizava as eleições era o Governo, e ele nunca perdera uma eleição… O IBGE divulgou que o Brasil fechou 2016 com 116 milhões de pessoas conectadas à Internet, o que equivale a quase 2/3 da população acima de 10 anos de idade. Cerca de 94,6% dos internautas brasileiros trocam mensagens de texto, voz ou imagens por aplicativos de bate-papo.
Nesta Era Digital, as redes sociais e a mídia são os novos instrumentos de convencimento do eleitor e devem ser garantidas no seu relevante papel social. Não devem ser desprezadas ou perseguidas, mas reprimidas ou inibidas tão somente no que exorbitarem da conduta honesta.
Garantir a livre atuação das redes sociais é dever de toda a sociedade através da Justiça Eleitoral, tanto quanto a Justiça Eleitoral deve garantir livre acesso do eleitor ao local de votação, a atuação dos partidos e de seus simpatizantes voluntários ou contratados, a divulgação do que for necessário para que as eleições sejam limpas, honestas e eficazes para legitimar o eleito. A praça é do povo, assim como o céu é do condor, poetava Castro Alves há quase duzentos anos.
A rede social é hoje a praça pública dos séculos anteriores, como o principal local das manifestações políticas.
Sabem todos que a Justiça Eleitoral dispõe dos meios jurídicos para garantir as eleições limpas, e que a férrea exiguidade de alguns prazos eleitorais previstos em lei não impede o descobrimento da verdade.
Por exemplo, ultrapassado o prazo de quinze dias do art. 14, § 10, da Constituição, para a ação de impugnação do mandato eletivo, os autores, os partícipes e os beneficiados pelo ilícito ainda assim serão processados em ações penais e cíveis para serem punidos pelos abusos.
Nem a Tecnologia da Informação, inovadora e mutável, fica imune aos efeitos da norma constitucional do art. 5o, LVI, porque são admissíveis no processo todos os meios de prova, desde que obtidos licitamente. O juiz em cada caso busca a verdade.
O Código de Processo Civil, por muitos denominado Código Fux, no art. 378, renova o dever de todos, e não só das partes, de trazer a verdade à Justiça: Ninguém se exime do dever de colaborar com o Poder Judiciário para o descobrimento da verdade.
E impõe ao juiz o dever de determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária (art. 139, IV). A verdade liberta (João, VIII, 32). Sem a verdade não há Justiça. Não há Democracia. Não há Governo legítimo. Não há Autoridade.
Sem a verdade não há vida civilizada!