Em arti­go pub­li­ca­do, orig­i­nal­mente, no Jor­nal O Povo, Matilde Ribeiro - Pro­fes­so­ra da Uni­ver­si­dade da Inte­gração Inter­na­cional da Luso­fo­nia Afro-Brasileira -UNILAB, ex-Min­is­tra da Igual­dade Racial, que, recen­te­mente, com­pôs o Grupo Téc­ni­co de Igual­dade Racial da Equipe de Tran­sição do Gov­er­no Lula — comen­ta a grave situ­ação pela qual pas­sa o Povo Yanoma­mi.

Matilde Ribeiro, que é Douto­ra em Serviço Social pela Pon­tif­í­cia Uni­ver­si­dade Católi­ca de São Paulo — PUCSP, Douto­ra Hon­oris Causa pela Fun­dação Uni­ver­si­dade Fed­er­al do ABC — UFABC e Coor­de­nado­ra do Comitê Esper­ançarref­ere a incom­pat­i­bil­i­dade da situ­ação desumana e calami­tosa dos indí­ge­nas com a justiça e a democ­ra­cia.

Leia, a seguir, a ínte­gra do arti­go.

 

Desumanização e calamidade não combinam com justiça e democracia

 Matilde Ribeiro

 

Impos­sív­el não prestar atenção, lamen­tar e lutar con­tra a ter­rív­el situ­ação de desuman­iza­ção e calami­dade, viven­ci­a­da pelos Yanoma­mi. Sem som­bra de dúvi­da, é bem-vin­da a dec­re­tação por parte do Gov­er­no Brasileiro, da “emergên­cia de saúde públi­ca”, visan­do o inves­ti­men­to na mel­ho­ria de infraestru­tu­ra dos polos de saúde indí­ge­na, logís­ti­ca, insumos, medica­men­tos, equipa­men­tos, água potáv­el, ener­gia e inter­net. Ain­da, o Min­istério de Justiça e Segu­rança Públi­ca, em Nota Ofi­cial, deter­mi­nou a aber­tu­ra de inquéri­to pela Polí­cia Fed­er­al, para apu­rar crimes de genocí­dio e ambi­en­tais.

A base para as con­tun­dentes denún­cias e para as medi­das gov­er­na­men­tais em caráter de emergên­cia é que os Yanoma­mi, ocu­pantes da fron­teira da Venezuela com o Brasil (Roraima e Ama­zonas), vivem há muito tem­po ameaças pelos efeitos per­ver­sos do garim­po ile­gal e da dev­as­tação ter­ri­to­r­i­al; vio­lên­cia sex­u­al de mul­heres e cri­anças; fome e desnu­trição; deses­tru­tu­ração do atendi­men­to à saúde, prej­u­di­can­do o trata­men­to de doenças como malária, diar­reia, infecção res­pi­ratória, etc.

A somatória dessas situ­ações tem cau­sa­do mortes em mas­sa, um ver­dadeiro genocí­dio! Ati­tudes urgentes e con­tin­u­adas são impor­tan­tís­si­mas. Nesse sen­ti­do, dois acon­tec­i­men­tos recentes con­tribuíram para a definição das medi­das emer­gen­ci­ais, em cur­so.

Em 14 de jul­ho de 2022, rep­re­sen­tantes de enti­dades vin­cu­ladas à causa indí­ge­na – a Artic­u­lação dos Povos Indí­ge­nas do Brasil (APIB); o Con­sel­ho Indí­ge­na de Roraima (CIR); e, o Con­sel­ho Indi­genista Mis­sionário (CIMI) em con­jun­to com diver­sas autori­dades e insti­tu­ições, em audiên­cia na Câmara dos Dep­uta­dos, defini­ram as situ­ações já citadas, como uma “tragé­dia human­itária”. E, denun­cia­ram a ausên­cia de soluções, mes­mo diante de cobranças inter­na­cionais e das autori­dades brasileiras.

O pres­i­dente Lula, acom­pan­hado de ministras/os, secretárias/os e médicas/os real­i­zou visi­ta, em 21 de janeiro de 2023, ao Povo Yanoma­mi, em Roraima, Nes­sa opor­tu­nidade, em rep­re­sen­tação ao Min­istério de Saúde, o Secretário de Saúde Indí­ge­na Weibe Tape­ba, cearense e indí­ge­na, clas­si­fi­cou a necessária assistên­cia emer­gen­cial, como “oper­ação de guer­ra”.

A situ­ação pode ser chama­da de “oper­ação de guer­ra”, genocí­dio, crise san­itária e human­itária, mas o fato é que tudo isso é muito assus­ta­dor. Há neces­si­dade pre­mente de enfrenta­men­to dessa insus­ten­táv­el real­i­dade, e, de fortís­si­mo e con­tin­u­a­do envolvi­men­to de enti­dades de dire­itos humanos, indí­ge­nas e indi­genistas, e sócio-ambi­en­tais; meios de comu­ni­cação; poderes públi­cos; e, de toda a sociedade na con­strução de soluções.

Diante dessa triste história, o Brasil tem que faz­er valer o aler­ta da anti­ga canção pop­u­lar: “Todo dia é Dia de Índio”. E, não é demais acres­cen­tar que, todo dia, é tam­bém de justiça, humanidade e democ­ra­cia!